terça-feira, 31 de agosto de 2010

Mentes em Movimento (11)


O grupo de trabalho coordenado por Fred Gage e Henriette van Praag, do Instituto alk, em La Jolla, na Califórnia, forneceu informações inéditas sobre a neurog~enese em idade avançada. Os neurobiólogos treinaram ratos de 19 mesmes durante várias semans com rodas de exercícios. Depois, os animais idosos foram submetidos ao "water maze test" - um experimento para avaliar a memória no qual eles nadam dentro de uma bacia d'água e devem se lembrar do local onde está uma plataforma que pode salvá-los. E vejam só: os velhinhos esportistas conseguiram cumprir a tarefa melhor do que os roedores sedentários da mesma idade. Além disso, o índide de neurogênese nos animais treinados era apenas pouco menor do que o de cobaias jovens. Aparentemente, a perda de hardware neuronal com a idade pode ser, em parte, compensada.
"O desenvolvimento do cérebro dura a vida inteira", confirma também o pesquisador da neurogênese Gerd Kempermann, da Universidade Técnica de Dresden. No final dos anos 90, ele descobriu junto com Van Praag e Gage que a atividade física estimula o crescimento de neurônios também em adultos. Os pesquisadores Charles Cotman e Nicole Berchtold, da Universidade da Califórnia em Irvine, descobriram as causas moleculares: camundongos que corriam assiduamente na roda produziam mais um importante fator de crescimento neuronal (BDNF). E após um descanso de vários dias os animais voltavam a atingir rapidamente o nível que os seus semelhantes não treinados só conquistavam por meio de um programa de corrida de semanas.
Mas o que acontece no caso da demência já presente? Será que o declínio intelectual pode ser refreado pelo exercício? Isso foi estudado em 2005 por um grupo coordenado por Paul Adlard, também, também da Universidade da Califórnia, em camundongos geneticamente alterados. Os animais foram induzidos artificialmente a desenvolver um problema genético que causa redução das células neurais. A situação é semelhante à de pessoas com Alzheimer. Os pesquisadores dividiramos os roedores doentes em dois grupos. A única diferença é que em uma das gaiolas havia uma roda de exercícios e na outra não. Após cinco meses, os animais que corriam apresentaram menos placas amiloides no córtex do lobo frontal e temporal do que outros, da mesma idade, que estavam em gaiolas comuns. No hipocampo foi encontrada apenas metade dos emaranhados de proteínas que caracterizam a doença.

Da revista Mente & Cérebro n° 211, agosto/2010



domingo, 29 de agosto de 2010

Tênues Fronteiras (1)


Por Gaël Chételat e Catherine Lalevée



Seu Vitório está ficando esquecido. Aos 65 anos, vive procurando seus objetos pessoais, sem conseguir lembrar onde os colocou. Às vezes vai até a cozinha e se pergunta, confuso, o que pretendia fazer lá. A família está preocupada e quer que ele procure um médico. Guardar a carteira no lugar errado, esquecer um aniversário - isso pode acontecer com qualquer um, vez ou outra. Afinal, não é comum que pequenos "brancos" se tornem mais frequentes com a idade? Seu Vitório nunca viu motivo para preocupação até o dia em que esqueceu de buscar o neto na escola. A partir daí também ficou cismado: até que ponto esse tipo de esquecimento é normal? Seriam os primeiros sinais da doença de Alzheimer?
A preocupação de seu Vitório tem fundamento. A doença de Alzheimer é extremamente rara em pessoas com menos de 60 anos, nas quais, problemas de memória quase sempre são consequência de stress ou depressão. A partir da sexta década de vida, porém, o risco de desenvolver a doença aumenta significativamente. Para ter uma ideia, entre 60 e 65 anos, uma em cada 20 pessoas é diagnosticada com o distúrbio: acima dos 85, essa relação é de 1 para 4.
A doença de Alzheimer é uma doença neurodegenerativa que acomete neurônios de diversas regiões cerebrais. Por isso, os indivíduos afetados não sofrem apenas de problemas de memória, mas também de outros distúrbios cognitivos que incluem a fala, a capacidade de concentração, orientação espacial, raciocínio e cálculo. Não há cura, e as terapias disponíveis apenas retardam o desenvolvimento da doença por alguns poucos anos. A administração de drogas para aumentar os níveis do neurotransmissor acetilcolina no cérebro, por exemplo, auxilia a comunicação neuronal e tende a desacelerar a sua degeneração. Esse tratamento é até três vezes mais eficaz no estágio inicial da doença do que mais tarde, quando os sintomas se desenvolveram por completo e a transmissão entre os neurônios já foi comprometida.
Diagnóstico precoce, portanto, é fundamental. Na verdade, a comprovação inequívoca de que alguém sofre de Alzheimer só é possível por meio da análise do tecido cerebral e só pode ser realizada, obviamente, depois da morte do paciente. Na prática clínica, para diferenciar a doença de Alzheimer de outros tipos de demência e distúrbios neurológicos, a medicina dispõe de testes neuropsicológicos e procedimentos de imageamento que permitem inferir o estado de deterioração cerebral.


Da edição especial "Doenças do Cérebro" n°1, da revista Mente & Cérebro, maio/2010




sábado, 28 de agosto de 2010

Mentes em Movimento (10)


Várias dessas comparações entre os que gostam de se exercitar e outros mais ociosos apontam na mesma direção: os ativos têm melhores resultados em quesitos como atenção, memória e capacidade intelectual: conseguem memorizar mais informações, as processam melhor e demoram mais a se cansar.
No entanto, ainda há uma questão a ser resolvida. Pessoas bem ou mal condicionadas provavelmente se diferenciam também em outros pontos. Talvez as primeiras tenham, já por princípio, hábitos mais saudáveis e se alimentem melhor. Mesmo que isso seja verdade, não se pode desprezar o efeito do bom condicionamento. Que o exercício protege contra infartos, diabetes ou mesmo osteoporose, já se sabe há muito. E quem está em melhores condições físicas também não sofre um declínio mental tão rápido. Pesquisadores querem saber, porém, se o exercício na velhice também tem efeito direto sobre o cérebro. Um pessoa saudável que chega aos 90 anos já perdeu até 20% dos neurônios que possuía quando jovem. No entanto, novas células neurais surgem ininterruptamente - só no hipocampo estima-se que apareçam vários milhares por dia. Ou seja: o cérebro em envelhecimento também passa por constante transformação.
O especialista em biomedicina Stanley Colcombe e colegas da Universidade de Illinois, em Urbana-Champaign, comprovaram isso em um estudo em 2006. Os pesquisadores dividiram, por sorteio, 59 idosos saudáveis entre 60 e 79 anos em três grupos: o primeiro passou por um treinamento cardiovascular; o segundo realizou exercícios de alongamento e o terceiro, um programa de relaxamento. Todos os participantes treinaram três vezes por semana durante seis meses e, antes de depois desse período, tiveram o cérebro examinado no laboratório. Ficou demonstrado que o volume do lobo frontal, assim como o do temporal, cresceu após os exercícios de resistência. Como isso ocorreu exatamente é difícil de estudar em seres humanos. Para esclarecer a questão, os pesquisadores recorrem ao modelo animal.

Da revista Mente & Cérebro n° 211, agosto/2010


sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Músculos em forma, cabeça saudável (9)


[ final ]

É preciso reconhecer, porém, que o público deve estar consciente de que ainda há muito que não se sabe sobre a cognição na terceira idade, bem como algumas controvérsias sobre a magnitude e durabilidade dos resultados. As pessoas esstão começando a comercializar jogos de computador e outros métodos par exercitar a mente e, frequentemente, fazem fortes alegações sobre a eletividade dos produtos, que não são amparadas por estudos científicos. Os consumidores deveriam procurar evidências demonstrando os benefícios do uso de qualquer desses produtos, que podem, não obrigatoriamente, incorporar todas as características necessárias para aumentar a saúde mental de pessoas idosas.
Certamente as próximas décadas oferecerão possibilidades para expandirmos nossos conhecimentos sobre envelhecimento e cognição. Temos motivos para crer que, em breve, devemos ampliar os limites de um bom funcionamento intelectual na velhice. Assim como os avanços médicos podem aumentar a longevidade, descobertas da psicologia podem contribuir com todos que pretendem ganhar anos de vida - e qualidade de viver.

Da revista Mente & Cérebro n° 211, agosto/2010

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Como proteger a saúde do ar seco




Clima favorece crises respiratórias e até problemas mais graves como o infarto


Fernanda Aranda, iG São Paulo


Hidratação é essencial para combater os efeitos do ar seco no corpo

O clima de “Saara” predomina em nove Estados brasileiros e no Distrito Federal, alerta o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). A umidade relativa do ar beira a casa dos 30%, metade do que preconiza a Organização Mundial de Saúde (OMS) para não fazer mal ao organismo (60%) em São Paulo, Minas Gerais, Tocantins, Goiás, Distrito Federal, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Bahia, Pará e Rondônia.

O tempo seco, além de incômodo, aproxima problemas de saúde como rinite, asma e bronquite, além de outros mais sérios como infarto e acidente vascular cerebral (AVC).

A boa notícia é que algumas “receitas caseiras” ajudam a melhorar a qualidade do clima que chega aos pulmões. Colocar uma bacia cheia d’água no ambiente de trabalho – ou na sala e quarto – funciona mesmo, garantem os especialistas. Deixar o ambiente mais úmido é uma excelente maneira de evitar que os hospitais fiquem mais cheios. Dados da Secretaria Municipal de Saúde paulistana indicam que quando o ar está seco, o movimento na ala de inalação cresce em até 30%, com picos de 50% a mais de movimento.

Já para os casos de infarto e derrame a explicação da Sociedade Brasileira de Cardiologia é que o sangue fica mais denso, “entope” mais as veias e faz com que os acidentes vasculares cerebrais e panes no coração fiquem mais recorrentes. Se atrelado ao fenômeno de baixa umidade, a temperatura estiver alta, oito idosos morrem a mais por dia, já contabilizou o Laboratório de Poluição da Universidade de São Paulo (USP).

O acúmulo de poluentes é outra consequência ruim da temperatura seca. Os gases tóxicos não conseguem dispersar na atmosfera, o que deixa os olhos com mais ardência e a garganta seca, com pigarro.

Para aliviar os sintomas, a Secretaria de Saúde de São Paulo dá algumas dicas para lidar melhor com o ar seco:

• Crianças e idosos são os mais afetados pela baixa umidade do ar, por isso, é necessário atenção especial a esses dois grupos. Incentive a ingestão de bastante água (cerca de dois litros ao dia), além de sucos naturais feitos de maneira adequada e água de coco
• Também é importante manter a higiene doméstica. Evite o acúmulo de poeira, que desencadeia problemas alérgicos
• Prefira alimentos frescos e produzidos o mais próximo possível do horário de consumo. Substitua frituras por alimentos assados, assim como o sorvete de massa por picolé, especialmente de frutas. Queijos amarelos podem ser trocados por queijos brancos
• Durma em local arejado e umedecido. Isso contribui para uma noite de sono tranqüila (os ambientes podem ser umidificados com toalhas molhadas, reservatórios com água e até umidificadores)
• A pele também merece atenção especial neste período. Evite banhos com água muito quente, que ressecam a pele, e use, sempre que possível, um creme hidratante. Em caso de irritação das vias aéreas e dos olhos, use soro fisiológico para lavar os olhos e as narinas.


Fonte: www.delas.ig.com.br

O enigma ALZHEIMER (10)


Controvérsias em torno da morte neuronal

[ final ]

Pesquisadores questionam o papel da proteína tau como causadora da degeneração dos neurônios, presente nas doenças neurodegenerativas. Nos neurônios de pacientes com Alzheimer, encontram-se novelos de fibras estranhamento enredadas. Elas são compostas de proteína tau, que normalmente estabiliza o cito-esqueleto; no entanto, quando elas se emaranham, perdem a função de sustentação. Essa seria a principal causa da morte neuronal massiva que afeta os pacientes - pelo menos é o que acreditavam os pesquisadores. Fortes indícios para tal suspeita tinham sido fornecidos por camundongos genetivamente modificados, cujas células produziam uma forma "pegajosa" de taus haumanas. Pois sua massa cerebral se reduzia rapidamente com o tempo - e, com ela, a capacidade de aprendizado. Em 2005, pesquisadores da Universidade de Minnesota contestaram tal teoria com um truque refinado: eles criaram um freio de emergência em "camundongos-tau", com o qual a produção dessa proteína poderia ser interrompida a qualquer momentos, após ingestão de uma substância denominada doxiciclina. Foi o que fizeram Karen Ashe e seus colegas com animais de alguns meses de idade cujo cérebro e memória já haviam sido bastante afetados. No teste do labirinto, por exemplo, eles tinham claramente mais dificuldade em memorizar o caminho que seus semelhantes saudáveis. Apesar da dose de doxiciclina, os novelos de tau continuaram a se formar. No entanto, não só a morte das células nervosas foi interrompoida, como a memória dos roedores voltou à ativa. Aparentemente, portanto, os novelos de tau não seriam os únicos vilões. Em agosto de 2009, pesquisadores da Escola de Medicina Albert Einstein, da Universidade Yeshiva, em Nova York, liderados pela professora de anatomia e de biologia estrutural e medicina Ana Maria Cuervo, trouxeram nova luz para a morte dos neurônios, característica de doenças degenerativas, como Parkinson e Alzheimer. Segundo o estudo, feito com pacientes com Parkinson, o processo deflagrador da degeneração neuronal estaria em uma falha no mecanismo de autorreparação celular, a autofagia. Por meio dele, as células reciclam ou digerem moléculas danificadas. No caso do Parkinson e do Alzheimer, porém, ocorreria um desequilíbrio nesse processo, levando à acumulação de compostos tóxicos e à consequente morte do neurônio.


Da série especial "Doenças do Cérebro" n° 1, maio/2010, da revista "Mente & Cérebro"

Os autores desta série:
Roland Brandt é formado em filosofia e bioquímica. Desde 2002 é professor de neurobiologia da Universidade de Osnabrück, Alemanha.
Hartwig Hanser é bioquímico e docente.




quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Mentes em Movimento (9)


Combate à demência



É preciso reconhecer, porém, que isso nem sempre ocorre: muits vezes, a atividade física não eleva o desempenho cognitivo de jovens adultos. Cérebros que trabalham "no limite" raramente podem ser ainda mais acelerados. Na idade adulta média, as pessoas tiram menos proveito direto das boas condições neuronais. Nesse caso, o que faz direferença é o fortalecimento da saúde física e psíquica. Nessa fase é mais saudável evitar a exigência excessiva consigo mesmo devido à ambição esportiva exagerada.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que só no Brasil 1 milhão de pessoas sofrem de demência por Alzheimer. Devido ao envelhecimento da população e ao aumento da estimativa do tempo de vida, esse número deve crescer muito nos próximos anos. Até 2050, a porcentagem de homens e mulheres com mais de 60 anos na população deve dobrar. O problema é que, nesse último terço de vida, a probabilidade de uma pessoa adoecer de Alzheimer se eleva imensamente.
No entanto, o risco pode ser reduzido por meio de um estilo de vida ativo. Ao lado da alimentação saudável e do estímulo da rede de relacionamentos, os exercícios físicos parecem ser a prática mais adequada pra manter a capacidade cognitiva por mais tempo. O pesquisador Eric Larson, da Universidade de Washington em Seattle, por exemplo, demonstrou que esportistas adoecem mais raramente de Alzheimer. Ele estudou 1.740 homens e mulheres com mais de 65 anos. No início da investigação de longo prazo, todos os participantes não apenas estavam saudáveis, mais apresentavam altos resultados para a faixa etária no teste de inteligência Cognitive Ability Screning Instrument (CASI). Os médicos examinavam os voluntários a cada dois anos, avaliando sinais de demência incipiente. Paralelamente, foram levantados o tipo de atividade física que praticavam e a frequência com que o faziam, além de dados sobre o estado geral de saúde, a condição psíquica, hobbies, etc.
Após seis anos, 158 sujeitos estavam dementes e 107 tinham diagnóstico de Alzheimer. O índice dos doentes entre aqueles que exerciam atividades físicas três vezes por semana ou mais estava em 13 por 1.000 - uma proporção mais baixa que o valor de praticamente 20 entre os inativos. O esporte reduziu especialmente o risco de demência ente aqueles que haviam apresentado as piores condiçoes físicas antes do início do treinamento.


Da revista Mente & Cérebro n° 211, agosto/2010


terça-feira, 24 de agosto de 2010

Músculos em forma, cabeça saudável (8)

[ continuação ]

De forma geral, pessoas otiistas, flexíveis, abertas a novas experiências, positivamente motivadas e focadas no que realmente lhes faz bem têm mais chances de envelhecer com saúde física e mental, tirando vantagens das oportunidades e lidando de forma mais equilibrada com frustrações inevitáveis, mantendo o sentimento de bem-estar e de satisfação. Sofrimento psicológico crônico - resultante de depressão, ansiedade e raiva ou vergonha não elaboradas - está associado a uma variedade de prognósticos que podem se agravar com o passar do tempo e acelerar o declínio cognitivo. Estudos têm, de forma consistente, mostrado que um nível maior de dor psíquica será ligado ao aumento da incidência da doença de Alzheimer e a prejuízos moderados intelectuais na velhice.
Porém, não existe uma pílula mágica ou uma vacina que evite o declinio cognitivo. Uma questão crítica para os futuros pesquisadores será entender como um estilo de vida mais saudável pode ser promovido e implementado durante os anos em que as pessoas ainda são intelectualmente produtivas. Apesar dos inevitáveis conflitos entre as exigências profissionais e o tempo disponível para outros papéis e atividades (ser pai ou mãe, por exemplo), é fundamental incorporar a prática de exercícios físicos e atividades prazerosas ao cotidiano. Incentivar essas escolhas vai além do benefício individual: pode ser considerado uma questão de saúde pública.

Da revista Mente & Cérebro n° 211, agosto/2010

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

O enigma ALZHEIMER (9)


Pílulas da Memória

Cientistas se esforçam para desenvolver terapias eficazes no combate a perdas cognitivas, como as da doença de Alzheimer

[ Por Rafael Roesler, biólogo e neurocientista ]


A busca da "pílula da memória" é hoje um dos grandes desafios da pesquisa médica. O desenvolvimento desse tipo de medicamento é dificultado pela complexidade da memória. No entanto, a compreensão dos mecanismos moleculares que permitem a formação e recordação de memórias no cérebro tem permitido a identificação de compostos químicos que podem trazer benefícios de forma eficiente e segura. Alguns medicamentos já estão em fase
experimental em humanos.
Um grande número de estudos em animais demonstra que a substância adenosina monofosfato cíclico (AMPc) é um mensageiro químico fundamental para a facilitação da transmissão nervosa e a formação da memória. Compostos que aumentam os níveis cerebrais de AMPc estão sendo testados como potenciais "pílulas inteligentes".
O aminoácido glutamato é o principal transmissor químico que ativa os neurônios e dá início à sequência de eventos bioquímicos que permite o reforço das sinapses e a formação da memória. O glutamato age ligando-se a proteínas nas membranas dos neurônios, os receptores glutamatérgicos. Compostos chamados ampakinas, que estimulam de forma seletiva os receptores glutamatérgicos, estão em fase adiantada de testes clínicos e apresentam resultados promissores para o tratamento de disfunções de memória associadas ao Alzheimer e outras doenças neuropsiquiátricas.
Estudos feitos por nosso grupo de pesquisa indicam que peptídeos (pequenas proteínas) da família da bombesina, encontrada na pele de sapo, ou substâncias sintéticas semelhantes a eles, podem melhorar a memória em animais de laboratório e prevenir a perda de memória em modelos animais de doenças neurológicas.


Da série especial "Doenças do Cérebro" n° 1, da revista Mente & Cérebro


domingo, 22 de agosto de 2010

Mentes em Movimento (8)


Epigenética e Cura


No caso de quadros de ansiedade e depressão a prática esportiva favorece a recuperação do controle sobre a própria vida, ajuda a pessoa a voltar a fazer algo por si mesma e a desfrutar de um lugar no grupo de treinamento. Ao que tudo indica, a prática regular diminui o risco de recaídas. Dez meses após o término do programa esportivo do estudo de Blumenthal, menos participantes retomaram o tratamento, em comparação com o grupo que recebeu medicamentos. Isso ocorreu principalmente quando os pacientes lcontinuaram se exercitanto de maneira regular depois do fim do experimento.
No entanto, independentemente das condições psíquicas, os efeitos positivos do exercício podem ser comprovados. A palavra mágica é "epigenética". Ela designa o complexo processo no interior das células que determina qual informação genética será lida em que momento e transformada em novas proteínas e substâncias mensageiras. Essas modulações genéticas também ajudam a determinar se - e quantos - novos receptores, ligações sinápticas e neurônios devem surgir, inclusive no cérebro saudável.
Hoje se sabe que a atividade física influencia a ativação e desativação de mais de 500 genes. Isso foi demonstrado pelos pesquisadores James Timmons e Carl Sundberg, do Instituto Karolinska, de Estocolmo, quando eles "receitaram" exercícios ergométricos a um grupo de homens jovens.
O neurobiólogo molecular Jeff Lichtman, da Universidade Harvard, comprovou em 1999 a rapidez com que alterações neuronais podem ocorrer. O pesquisador injetou uma tinta especial fluorescente no tecido intacto de cobaias, e assim puderam ser marcadas moléculas receptoras na membrana de células neurais e musculares às quais se conecta a acetilcolina, uma substância mensageira que transmite ordens de movimentação para as junções sinápticas, os locais de ligação entre o nervo e o músculo. O cientista esperava que uma estimulação artificial das transmissões de sinais levasse a alterações após alguns dias ou semanas, mas a densidade dos receptores aumentou muito após poucas horas.
Em outro estudo, um grupo coordenado pela médica Ana Pereira, da Universidade Columbia, em Nova York, selecionou voluntários saudáveis com idade entre 21 e 45 anos, com pouco contato com esportes. Após a realização de um teste de memória e de uma tomografia por ressonãncia magnética (TRM), iniciou-se o treinamento na esteira ou na bicicleta na academia da própria universidade quatro vezes por semana, durante uma hora, por três meses. Depois desse período, os candidatos repetiram os testes de memória e resistência física, assim como o exame do cérebro. O hipocampo, importante para a capacidade mnemônica, passou a ter melhor circulação sanguínea, e os afetados tiveram pontuação mais alta nos experimentos de aprendizado.


Da revista Mente & Cérebro n° 211, agosto/2010



sábado, 21 de agosto de 2010

Músculos em forma, cabeça saudável (7)

[ continuação ]

Apoiando esses resultados, um vasto conjunto de estudos em animais demonstrou numerosas alterações na estrutura e função do cérebro depois que os animais foram expostos a ambientes complexos, com vários estímulos. A exposição a esses ambientes enriquecidos traz diversos benefícios neuropsicológicos. Em primeiro lugar, aumenta a formação de novos braços dendríticos e sinapses - áreas das células neurais que recebem e enviam sinais de comunicação, aumentam o número de células gliares, que sustentam a saúde dos neurônios, e expandem a rede capital de fornecimento de oxigêncio, favorecento o desenvolvimento de novos neurônios e crianado mudanças nas cascatas moleculares e neuroquímicas, como o auto das neutrofinas (moléculas que protegem o cérebro e ampliam redes neurais).

Resolver quebra-cabeças e fazer abdominais também fortalece a saúde cerebral. Outra providência para ficar esperto mais tempo é participar de grupos sociais. A convivência pode atrasar em vários anos o aparecimento da demência. O alvo tradicional dessa pesquisa tem sido a medição objetiva do isolamento social em contraste com o vínculo social. São observadas a frequência com que uma pessoa participa de grupos (como de trabalho voluntário), o número de amigos e parentes que contata regularmente (em outras palavras, o tamanho de sua rede social) e seu estado civil. Descobertas sobre os aspectos positivos de atitudes e crenças são mais pontuais. Posturas e atitudes positivas podem ter importantes efeitos indiretos no enriquecimento da cognição em razão de sua influência no tipo de comportamento associado aos estímulos intelectuais (por meio de conversas, aprendizado, etc.)

Da revista Mente & Cérebro n° 211, agosto/2010

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

O enigma ALZHEIMER (8)




Formação Intelectual


O que cada um de nós pode fazer a fim de reduzir o risco de contrair a doença de Alzheimer?


Primeiramente, evitar os fatores de risco. Contra alguns deles, como o envelhecimento, não se pode fazer muita coisa. Há, porém, estudos que indicam uma possibilidade mais viável de prevenção: quanto maior a escolaridade e a formação profissional, menor o risco de contrair a doença na velhice. Talvez neurônios mais ativos ofereçam mais resistência à enfermidade, ou a rede neuronal se associe com mais firmeza após uma formação intelectual ampla, opondo maior resistência à lesão. Mas essa formação é ineficaz quando a enfermidade já está instalada. E, de fato, as tentativas nesse sentido foram contrapoducentes.
Existem, além disso, indícios de que os antioxidantes da alimentação reduzem o risco de contrair a doença. Algumas substâncias, como as vitaminas C e E, encontradas em frutas, legumes (brócolis) e chá (verde e preto), parecem diminuir a quantidade das espécies reativas de oxigênio que, aparentemente, intervêm de maneira decisiva nos processos normais de envelhecimento.


Da edição especial "Doenças do Cérebro" n° 1, da revista Mente & Cérebro (maio/2010)


quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Mentes em Movimento (7)


Como nenhum outro estudo confirma esse efeito benéfico, os cientistas tentam encontrar explicação por meio de outras análises, incorporados os resultados de vários trabalhos. O mais novo estudo comparativo desse tipo foi publicado por especialistas em saúde coordenados por Gillian Mead, da Universidade de Edimburgo, em 2009. Após a avaliação de 25 estudos com mais de 900 participantes, os pesquisadores perceberam o alto potencial antidepressivo nos exercícios de resistência. No entanto, se forem utilizados padrões metódicos muito severos, o efeito desaparecerá. Assim, seria necessário que os participantes não soubessem se pertenciam ao grupo de controle ou ao de tratamento. Naturalmente, esse tipo de teste cego é praticamente impossível em programas esportivos. Não se sabe também qual o papel desempenhado pelo apoio social mútuo, já que quanto a pessoa corre, faz exercícios ou anda de bicicleta em grupo termina por desenvolver laços que podem influir em seu humor.
De maneira geral, a atividade física parece bastante adequada no caso de uma leve tendência à depressão ou de uma inquietação ansiosa. Mas quando há sintomas graves e causas profundas, como um trauma, somente o exercício não é suficiente. O estudo já citado desenvolvido por Karen Petty com jovens com sobrepeso nos leva a supor a mesma coisa. A "porção extra de esporte" fortaleceu autoestima de participantes brancos - mas o mesmo não ocorreu com os de origem afro-emericana! Nesses últimos, o desânimo aparentemente não apenas tinha raízes na insatisfação com a própria aparência, mas estava ligado a questõs mais amplas, como a discriminação e marginalização social.

Da revista Mente & Cérebro n° 211, de agosto/2010

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Músculos em forma, cabeça saudável (6)


[ continuação ]

Mudança Estrutural

Há consenso de que faz sentido treinr atividades mentais que estimulem a cognição, mas talvez seja menos óbvio o meio pelo qual a atividade física gera esse efeito. Basta considerar o bem documentado aumento de ligações entre atividades físicas e doenças. Uma vastidão de estudos examinou os benefícios dos exercícios e de uma vida ativa sedentária para prevenir patologias. Sabemos, por exemplo, que atividades físicas podem reduzir o risco de morte por problemas cardiovasculares, de desenvolver diabetes tipo 2, osteoporose e câncer de colo e mama.
Em um estudo publicado em 2006, o psicólogo Stanley J. Colcombe, da Universidade de Illinois, coordenou um grupo de pesquisadores que examinou a influência da ginástica em mudanças potenciais na estrutura cerebral. O experimento de seis meses incluiu 59 pessoas saudáveis, mas sedentárias, que residiam na comunidade, com idade entre 60 e 79 anos. As imagens cerebrais depois do treinamento com ginástica mostraram que mesmo intervenções com exercícios relativamente curtos restauravam algumas das perdas de volume cerebral associadas com o envelhecimento normal.


Da revista Mente & Cérebro n° 211, agosto/2010

terça-feira, 17 de agosto de 2010

O enigma ALZHEIMER (7)


Camundongos transgênicos


Há indícios favoráveis par a "hipótese amiloide". Algumas formas particularmente agressivas e precoces da doença de Alzheimer se acumulam em determinadas famílias. As causas genéticas comuns, porém, só justificam 5% de todos os casos da doença. A proteina precursora da A-beta de alguns desses pacientes sofre uma mutação genética: nos demais casos, o problema reside em outros genes, por exemplo nas presenilinas. É possível, entretanto, que todas as mutações ocorrem, em última instância, por meio da formação da proteína A-beta.
Os pacientes apresenaram muitas placas amiloides. Pesquisadores confirmaram essa possibilidade com comundongos transgênicos que fabricavam a correspondente proteina A-beta com mutação: alguns animais mostraram grandes quantidades de placas que lembravam os casos da doença de Alzheimer. Mas nenhum deles exibiu a degeneração neuronal tão clara como nos pacientes humanos. Para isso, é preciso a formação de fibrilas, algo que aconteceu nos ratos.
Eileen McGowan e sua equipe, da Clínica Mayo, nos Estados Unidos, cruzaram camundongos transgênicos (que produziam uma variante tau com tendência para a aglomeração) com animais que fabricavam mais placas amiloides. Obtiveram animais que não só apresentavam alguma quantidade de fibrilas de Alzheimer, mas também as depositavam nas mesmas regiões encefálicas dos pacientes com a doença. Assim ao que parece, placas e fibrilas realizam uma interação fatídica. É provável que os depósitos amiloides modifiquem a proteína tau, de forma que esta adquira propriedades "fatais", chegando a destruir os neurônios.
No futuro, poderemos criar modelos mais refinados para compreender melhor a doença de Alzheimer. Novas vias terapêuticas poderão então ser testadas. Medicamentos atuais, como os inibidores da acetilcolinesterase, tentam reforçar ao máximo e conservar as funções intelectuais do paciente. Assim, a doença pode ser detida alguns meses, mão não evitada nem revertida.
A maioria das novas estratégias dirige-se às placas amiloides que surgem em uma fase muito precoce da cascata de destruição celular. Nos laboratórios da Elan Pharmaceuticals foram imunizados, em 1999, camundongos transgênicos que produziam em excesso esses depósitos. Com isso, pôde ser evitada ou ao menos freada a formação das placas. No entanto, quando a empresa tentou transferir os resultados para a espécie humana e inoculou 360 pacientes com a doença de Alzheimer, muitos apresentaram encefalite, e o estudo precisou ser suspenso.
Foi realizada uma autópsia no primeiro desses pacientes. Ele tinha um número surpreendentemente baixo de placas amiloides no córtex cerebral, mas uma quantidade normal de fibrilas de Alzheimer, que supostamente causam morte neuronal direta.



Da série especial "Doenças do cérebro" n°1, da revista Mente & Cérebro (maio/2010)


segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Mentes em Movimento (6)


[ continuação ]

Por que isso acontece?
Motivo número um: um treinamento regular reduz o nível do hormônio do estresse, cortizol, que é liberado em razão da sobrecarga da hipófise. Essa reação faz com que o organismo seja imediatamente abastecido com energia adicional, mas a longo prazo isso prejudica as células cerebrais. A atividade física funciona aqui de forma "neuroprotetora" com os efeitos do cortizol.
Motivo número dois: o exercício eleva a concentração de triptofano no cérebro. Essa substância é um precursor do neurotransmissor serotonina que favorece o processamento das emoções. Em pessoas depressivas, o nívelde serotonina e a neurogênese são bastante reduzidos. Médicos tentam compensar essa situação por meio da administração de inibidores de recaptação da serotonina (SSRI). Esses medicamentos fazem com que haja maior quantidade disponível do neurotransmissor nos contatos sinápticos das células neurais.
Motivo número três: durante a atividade física, opioides endógenos (do próprio corpo) estimulam o centro de compensação do mesencéfalo. É provável que seja a causa do runner's high, frequentemente relatado por esportistas assíduos - um sentimento de bem-estar experimentado durante o treino. Esse componente emocional da atividade física é hoje utilizado com sucesso no tratamento de distúrgios psíquicos. Em um estudo de 2007, coordenado pelo psiquiatra James Blumenthal, da Universidade Duke em Durham, na Carolina do Norte, por exemplo, mais de 200 pacientes em diagnóstico de depressão foram separados em três grupos. Os integrantes do primeiro foram instruídos a realizar exercícios regulares para melhorar a resistência; o segundo foi tratado com sertralina, inibidor seletivo da recaptação da serotonina, e o terceiro recebeu placebo. Quatro meses mais tarde, metade dos voluntários que faziam exercícios regulares apresentou melhoras tão efetivas quanto os que receberam tratamento medicamentoso. No grupo que recebeu placebo ocorreu um fato curioso: um terço dos pacientes teve sintomas clínicos atenuados num primeiro momento.

Da revista Mente & Cérebro n° 211, agosto/2010

domingo, 15 de agosto de 2010

Músculos em forma, cabeça saudável (5)

[ continuação ]

As pesquisas que descrevemos examinam o desempenho mental por poucos anos. Alguns poucos estudos começam a olhar o que acontece em longas escalas de tempo. Em 2003, o psiquiatra Marcus Richards, da Universidade de Londres, no Reino Unido, e seus colegas, usando uma amostra de 1.919 homes e mulheres, focaram a influência de exercícios físicos e de atividades de lazer que os participantes disseram ter feito aos 36 anos e aos 43 nas mudanças de memória ocorridas entre os 43 e os 53 anos. As análises indicaram que o envolvimento em exercícios físicos e outras atividades de lazer, aos 36 anos de idade, estava associado a pontuações de memória mais altas aos 43. A atividade física aos 36 também estava ligada a um menor ritmo de perda da memória dos 43 aos 53 anos, depois que os dados foram ajustados com base nas atividades de lazer e outras variáveis. Os dados sugerem também poucos benefícios para memória dos que pararam de se exercitar aos 36, mas proteção àqueles que começaram a se exercitar depois dessa idade.
Quando ainda era estudante, o pesquisador Suvi Rovio, do Instituto Karokinska, na Suécia, e seus colegas examinaram a relação entre atividade física na meia-idade e os riscos de demência 21 anos depois, quando o grupo estudado tinha entre 65 e 79 anos. Os voluntários indicaram a frequência com a qual participavam de atividades de lazer, com duração mínima de 20 a 30 minutos, que causavam falta de fôlego ou sudorese. Incorporar essas práticas à rotina pelo menos duas vezes por seman, na meia-idade, estava associado à redução do risco de demência mais tarde. De fato, os participantes do grupo mais ativo tinham possibilidade 52% menor de desenvolver demência, em comparação com os sedentários.

Da revista Mente & Cérebro n° 211, agosto/2010

sábado, 14 de agosto de 2010

O enigma ALZHEIMER (6)


[ continuação ]

Os pesquisadores da empresa farmacêutica Sandoz, pertencente à Novartis, da Suiça, deram mais um passo quando, em 1995, geraram camundongos cujos neurônios continham quantidades muito menores da proteína tau humana. Os animais não revelaram grandes anomalias de comportamento nem alterações evidentes no cérebro ou fibrilas. Entretanto, a proteína tau estranha foi detectada em locais diferentes daqueles dos neurônios normais. No lugar do axônio, a proteína humana se multiplicava nas demais zonas de neurônios: pelos prolongamentos (dendritos) e pela rede celular. Ignoramos ainda qual é o significado dessa descoberta, mas também os pacientes com Alzheimer mostram fiblilas que se distribuem de preferência nessas zonas.
Outra diferença entre as duas proteínas tau era a alteração característica nas fibrilas humanas de Alzheimer. Nesse caso, a variação baseava-se no grau de fosforilação, isto é, de união posterior de grupos fosfato a determinados lugares com proteína tau. As células costumam se comportar assim para regular a função das proteínas. A proteína tau humana dos camundongos da empresa Sandoz estva muito mais fosforilada que a dos animais de outros laboratórios.
Por que os roedores não revelam as típicas fibrilas de Alzheimer? Talvez o processo de aglomeraçção ocorra lentamente. As fibrilas humanas aparecem, em geral, no sétimo decênio de vida ou mais tarde, ou seja, em uma idade que camundongos de laboratório não atingem. A suspeita apoia-se em estudos sobre alterações cerebrais ocorridas durante a evolução da doença de Alzheimer: segundo os estudos, a proteína tau se fosforila em um estágio precoce de formação das fibrilas, muito antes de começar a se aglomerar.
Seja como for, as fibrilas representam somente metade do enigma da doença de Alzheimer. Outro tipo de depósito encefálico (a placa amilóide) suscita várias perguntas. Essas placas não foram observadas apenas nas regiões encefálicas mais danificadas pela doença: foram vistas também no cérebro de muitas pessoas adultas que não sofriam da enfermidade e cujo tecido cerebral não apresentava degeneração superior à da média. Diante do fato, muitos pesquisadores acreditam que, no início da doença, a proteína A-beta é modificada. Ela desencadeia uma série de reações que culminam na degeneração catastrófica dos neurônios.

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Mentes em Movimento (5)



[ continuação ]

Petty ressalta, porém, que não se trata apenas de criar condições favoráveis ao desenvolvimento neuronal por meio da atividade física. Na verdade, o exercício e as experiências associadas a ele influenciam posturas e hábitos que afetam o caminho a ser seguido na vida. Por isso, a diversão deveria estar em primeiro lugar: uma atividade escolhida por vontade própria e divertida que gere experiências de sucesso. Isso estimula crianças efetivamente. A natureza já cuida para que isso ocorra, na medida em que provê os pequenos com uma intensa tendência natural ao exercício. Tudo depende "apenas" de que não as refreemos. O deslocamento das prioridades pessoais - estudo, trabalho, relacionamentos e família - quase sempre deixa a atividade física em segundo plano na idade adulta. Em outras palavras: as pessoas têm menos tempo e muitas vezes se acomodam, preferem ir aos lugares de carro em vez de bicicleta, e usam o tempo livra para namorar, resolver questões de trabalho ou ficar com os filhos em vez de se exercitar. Frequentar academias, por exemplo, exige abertura de espaço na agenda - e boa dose de determinação. Muitas vezes, porém, simplesmente não há tempo para entrar em forma.
Se perguntarmos a adultos por que deveriam (pelo menos teoricamente) se exercitar, recebemos respostas que levam em conta "meios para atingir o fim desejado": ajuda a emagrecer, manter a saúde, ter uma "válvula de escape" após um duro dia de trabalho. De fato, estudos comprovam que a prática regular de atividade física ajuda a combater o estresse e a aliviar a sobrecarga emocional.

Da revista Mente & Cérebro n° 211, agosto/2010

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Músculos em forma, cabeça saudável (4)


[ continuação ]

Riscos do Excesso

Durante a última década muitos estudos subestimaram a ligação entre a atividade física e a cognição. Em uma pesquisa publicada em 2001, a neuropsiquiatra Kristine Yaffe, da Universidade da Califórnia, em São Francisco, coordenou um grupo de cientistas que recrutou 5.925 mulheres com mais de 65 anos em quatro centros médicos americanos. As participantes não tinham deficiências físicas que limitassem sua capacidade de realizar atividades físicas, e todas foram testadas para garantir que não sofriam de problemas cognitivos. Os pesquisadores avaliaram as atividades físicas das voluntárias perguntando-lhes quantos quarteirões andavam e quantos lances de escada subiam diariamente. Em seguida, pediram que preenchessem um questionário sobre a prática de 33 atividades físicas. Após seis ou oito anos, os estudiosos avaliaram as funções cognitivas dessas mulheres. A mais ativa mostrou declínio cognitivo 30% menor que a que menos se movimentava. Ainda mais interessante: a distância das caminhadas estava relacionada à cognição, mas não à velocidade, o que leva a crer que mesmo níveis moderados de atividade física podem servir para limitar o declínio cognitivo em idosos.
Por outro lado, forçar o sistema circulatório com exercícios aeróbicos pode ser péssimo para o cérebro. Em 1995, em um estudo com 1.192 idosos de 70 a 79 anos, a neurocientista cognitiva Marilyn Albert, da Universidade Johns Hopkins, e seus colegas avaliaram a cognição dos participantes, com uma bateria de exames de aproximadamente 30 minutos, que incluia testes de linguagem, memória verbal e não verbal, habilidade de conceituação e visual-espacial. Eles descobriram que os melhores fatores preditivos para mudanças na cognição, em um período de dois anos, incluíam atividades extenuantes e picos no fluxo de expiração pulmonar. Em uma investigação publicada em 2004, a epidemiologista Jennifer Weuve, da Universidade Harvard, e seus colegas, também examinaram a relação entre atividade física e mudanças cognitivas, em um período de dois anos, em 16.466 enfermeiras com mais de 70 anos. Foi registrado quantro tempo elas haviam gasto, por semana, em uma série de atividades (corrida, caminhada, escalada, esportes com raquete, natação, ciclismo, danças aeróbicas) durante o ano anterior. As participantes forneceram também informações sobre o ritmo de caminhada, em minutos. O grupo de Weuve observou relação significativa entre a energia gasta nas práticas físicas e a cognição.

Da revista Mente & Cérebro n° 211, agosto/2010

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Cintura larga

Cintura larga aumenta risco de morte prematura, diz estudo

As causas mais comuns de morte da população pesquisada foram insuficiência respiratória, doenças cardiovasculares e câncer

BBC Brasil | 10/08/2010 15:33


Um estudo realizado nos Estados Unidos indica que pessoas que têm cintura larga têm uma chance maior de morte prematura, independentemente do IMC (índice de massa corporal, que mede a relação entre peso e altura).

Foto: Getty Images

Excesso: circunferência abdominal elevada é fator de risco para doenças cardíacas

A pesquisa da American Cancer Society sugere que cinturas maiores do que 110 centímetros nas mulheres e 120 centímetros nos homens dobram o risco de mortalidade em relação aos homens com cinturas menores do que 90 centímetros e mulheres com cinturas menores do que 75 centímetros.

Os pesquisadores analisaram dados de mais de 100 mil homens e mulheres com mais de 50 anos ao longo de nove anos. O estudo também sugere que, entre as mulheres, a ligação entre cintura larga e maior risco de morte é maior entre aquelas com peso considerado normal. Entretanto, os autores da pesquisa dizem mais estudos são necessárias para determinar a causa dessa relação entre cintura larga e mortalidade.

Causa de morte

O estudo, divulgado na publicação especializada Archives of Internal Medicine, analisou dados de 48.500 homens e de 56.343 mulheres, predominantemente brancos. No início do estudo, a idade média dos homens era de 69 anos, e das mulheres, 67. Durante os nove anos do estudo, 9.315 homens e 5.332 mulheres morreram. Os pesquisadores notaram que o risco de morte aumentava conforme o aumento da circunferência da cintura, independentemente de a pessoa ter peso normal, estar acima do peso normal ou de ser obesa.

A análise indicou um aumento significativo do risco entre os homens com cinturas maiores do que 110 centímetros ou em mulheres com cinturas a partir de 95 centímetros. Mas apenas em homens e mulheres com cinturas muito largas (acima de 120 centímetros para homens e acima de 110 centímetros para mulheres) o risco de morte dobrou.

A causa mais comum de morte foi insuficiência respiratória, seguida de doenças cardiovasculares e depois câncer. "Nossos resultados sugerem que, independentemente do peso, evitar o aumento na circunferência da cintura pode reduzir o risco de morte prematura", concluem os responsáveis pelo estudo.


Fonte: www.ultimosegundo.ig.com.br

O enigma ALZHEIMER (5)


[ continuação ]

Proteína Tau

Que papel a misteriosa proteína desempenha na doença de Alzheimer? A alteração característica dessa proteína nos pacientes com Alzheimer prejudicaria o cérebro? O "aumento tóxico da função" poderia contribuir para a deterioração, algo ilustrado por patologias como a doença de Huntington, em que a proteína modificada destrói de maneira ativa os neurônios. O mesmo ocorre com as formas hereditárias da esclerose lateral amiotrófica (ELA), um processo degenerativo dos nervos motores associado à atrofia muscular.
Para testar tal possibilidade, vários grupos de pesquisadores dos Estados Unidos e Bélgica introduziram, em 1999, a sequência do gene da proteína tau humana em camundongos que, a partir daquele momento, passaram a fabricar grandes quantidades da proteína humana, além da própria. Os animais testados em laboratório apresentaram alteraçõs degenerativas características dos axônios e também uma protéina tau compacta.
Mas infelizmente, as células nervosas mais afetadas não correspondem às da doença de Alzheimer em seres humanos, e sim aos neurônios do tronco do encéfalo e da medula espinhal. Os animais tiveram outros sintomas, como debilidade muscular e paralisia, próprios da ELA. Seja como for, as descobertas demonstraram que com quantidades elevadas da proteína tau os neurônios eram destruídos, ainda que, no caso da doença de Alzheimer, outro mecanismo deva operar.

Teoria das Janelas Partidas


Em 1969, na Universidade de Stanford (EUA), o Prof. Phillip Zimbardo realizou uma experiência de psicologia social. Deixou duas viaturas abandonadas na via pública, duas viaturas idênticas, da mesma marca, modelo e até cor. Uma deixou em Bronx, na altura uma zona pobre e conflituosa de Nova York e a outra em Palo Alto, uma zona rica e tranquila da Califórnia. Duas viaturas idênticas abandonadas, dois bairros com populações muito diferentes e uma equipe de especialistas em psicologia social estudando as condutas das pessoas em cada local. Resultou que a viatura abandonada em Bronx começou a ser vandalizada em poucas horas. Perdeu as janelas, o motor, os espelhos, o rádio, etc. Levaram tudo o que fosse aproveitável e aquilo que não puderam levar, destruíram. Contrariamente, a viatura abandonada em Palo Alto manteve-se intacta. É comum atribuir à pobreza as causas de delito. Atribuição em que coincidem as posições ideológicas mais conservadoras, (da direita e esquerda). Contudo, a experiência em questão não terminou aí, quando a viatura abandonada em Bronx já estava desfeita e a de Palo Alto estava há uma semana impecável, os investigadores partiram um vidro do automóvel de Palo Alto. O resultado foi que se desencadeou o mesmo processo que o de Bronx, e o roubo, a violência e o vandalismo reduziram o veículo ao mesmo estado que o do bairro pobre. Porquê que o vidro partido na viatura abandonada num bairro supostamente seguro, é capaz de disparar todo um processo delituoso? Não se trata de pobreza. Evidentemente é algo que tem que ver com a psicologia humana e com as relações sociais. Um vidro partido numa viatura abandonada transmite uma ideia de deterioração, de desinteresse, de despreocupação que vai quebrar os códigos de convivência, como de ausência de lei, de normas, de regras, como que vale tudo. Cada novo ataque que a viatura sofre reafirma e multiplica essa ideia, até que a escalada de atos cada vez piores, se torna incontrolável, desembocando numa violência irracional. Em experiências posteriores (James Q. Wilson e George Kelling), desenvolveram a 'Teoria das Janelas Partidas', a mesma que de um ponto de vista criminalístico, conclui que o delito é maior nas zonas onde o descuido, a sujeira, a desordem e o maltrato são maiores. Se se parte um vidro de uma janela de um edifício e ninguém o repara, muito rapidamente estarão partidos todos os demais. Se uma comunidade exibe sinais de deterioração e isto parece não importar a ninguém, então ali se gerará o delito. Se se cometem 'pequenas faltas' (estacionar-se em lugar proibido, exceder o limite de velocidade ou passar-se um semáforo vermelho) e as mesmas não são sancionadas, então começam as faltas maiores e logo delitos cada vez mais graves. Se se permitem atitudes violentas como algo normal no desenvolvimento das crianças, o padrão de desenvolvimento será de maior violência quando estas pessoas forem adultas. Se os parques e outros espaços públicos deteriorados são progressivamente abandonados pela maioria das pessoas (que deixa de sair das suas casas por temor às gangs), estes mesmos espaços abandonados pelas pessoas são progressivamente ocupados pelos delinquentes. A Teoria das Janelas Partidas foi aplicada pela primeira vez em meados da década de 80 no metrô de Nova York, o qual se havia convertido no ponto mais perigoso da cidade. Começou-se por combater as pequenas transgressões: grafitis deteriorando o lugar, sujeira das estacões, enbriaguês entre o público, não pagamento de passagem, pequenos roubos e desordens. Os resultados foram evidentes. Começando pelo pequeno conseguiu-se fazer do metrô um lugar seguro. Posteriormente, em 1994, Rudolph Giuliani, prefeito de Nova York, baseado na Teoria das Janelas Partidas e na experiência do metrô, impulsionou uma política de 'Tolerância Zero'. A estratégia consistia em criar comunidades limpas e ordenadas, não permitindo transgressões à Lei e às normas de convivência urbana. O resultado prático foi uma enorme redução de todos os índices criminais da cidade de Nova York. A expressão 'Tolerância Zero' soa a uma espécie de solução autoritária e repressiva, mas o seu conceito principal é muito mais a prevenção e promoção de condições sociais de segurança. Não se trata de linchar o delinquente, nem da prepotência da polícia, de fato, a respeito dos abusos de autoridade deve também aplicar-se a tolerância zero. Não é tolerância zero em relação à pessoa que comete o delito, mas tolerância zero em relação ao próprio delito. Trata-se de criar comunidades limpas, organizadas, respeitadoras da lei e dos códigos básicos da convivência social humana.

Texto recebido por e-mail - Não foi citado o autor

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Mentes em Movimento (4)


[ continuação ]

Pesquisas com animais indicam que principalmente o hipocampo, que funciona como uma central de aprendizagem e memória, é a área que mais tira proveito da melhor circulação sanguínea no cérebro e da produção desse "hardware" neuronal. Um estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Xangai com ratos de 5 semanas de idade e publicado em 2008 indicou que exercícios como caminhada moderada influenciam principalmente o giro dentado, um importante segmento do hipocampo. Uma quantidade elevada de substâncias mensageiras, como ofator de crescimento vascular (VGF, na sigla vascular growth factor) e o fator neurotrófico derivado do encéfalo (BDNF, brain derived neurotrophic factor), levou ao processo denominado neurogênese, que nada mais é que o crescimento de novas células neurais. Porém, o exagero dessa atividade benéfica teve efeito limitante: com excesso de corrida, a função construtora no cérebro dos roedores recrudescia.
Surgem, no entanto, questões inevitáveis: informações obtidas com animais podem ser transferidas para seres humanos? Será que o exercício é bom para crianças apenas porque o córtex de "ratos esportistas" é mais grosso e tem melhor circulação sanguínea? Os processo cerebrais são, em princípio, os mesmos em roedores e humanos. Portanto, parece óbvio que mecanismos semelhantes desencadeiem resultados similares. No caso de pessoas, no entanto, acrescentam-se inúmeros aspectos emocionais e interpessoais.
Se no início da vida é crucial o desenvolvimento do repertório motor, da linguagem e do pensamento, com o passar do tempo surgem outras prioridades, como adquirir competências sociais, testar os próprios limites e construir a autoconfiança por meio de vivências bem-sucedidas. Isso também pode ser facilitado pelo exercício.
Vários estudos já comprovaram que a atividade física eleva a sensação de bem-estar. Em um trabalho recente, a pesquisadora Karen Petty, colega de Tomporowski, comparou, por meio de questionário, a autoestima e o estado de espírito de adolescentes com sobrepeso antes e depois de um programa de treinamento de várias semanas. Resultado: no final, os participantes se mostravam mais animados, satisfeitos consigo mesmos e com uma autoimagem mais positiva.

Da revista Mente & Cérebro n° 211, agosto/2010

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Músculos em forma, cabeça saudável (3)


[ continuação ]

Diferentemente dos programas que abrangem habilidades específicas, como as estratégias de memorização, os treinamentos ajudam as pessoas a controlar a forma como parecem funcionar em capacidades mais amplas, úteis em muitas situações que requerem pensamento. Por exemplo, a psicóloga Chandramallika Basak e seus colegas da Universidade de Illinois recentemente revelaram que um jogo de estratégia em tempo real em vídeo que exija planejamento e controle executivo não favorece somente a performance no game, mas também melhora o desempenho em outros aspectos mensuráveis do controle executivo.
No entanto, não é imprescindível um teinamento especializado para alcançar melhoras ou diminuir o declínio cognitivo. Atividades diárias, como a leitura, podem ajudar. Nós revisamos evidências de ganhos cognitivos relacionados a diversas práticas em mais de uma dúzia de estudos. Em 2003, o neuropsicólogo Robert S.Wilson e seus colegas do Centro Médico da Universidade de Rush, em Chicago, recrutaram mais de 4 mil idosos de uma comunidade geograficamente definida e classificaram a frequência de sua participação em sete atividades cognitivas, como ler revistas. Por seis anos, em intervalos de três, os voluntários passavam por uma entrevista em casa, que incluía testes cognitivos breves. Os que praticavam essas atividades com mais frequência no início do estudo apresentaram menor declínio intelectual ao longo do tempo.

Da revista Mente & Cérebro n° 211, agosto/2010

domingo, 8 de agosto de 2010

O enigma ALZHEIMER (4)


Fibrilas de Alzheimer

[ continuação ]

Por essa razão, o principal "suspeito" da morte neuronal são as fibrilas de Alzheimer. Admite-se que a causa resida na estrutura modificada da proteína tau dos pacientes. No cérebro saudável, a proteína tau normal estabiliza os neurônios, pois une-se a um sistema tubular dinâmico (os microtúbulos). Trata-se de um componente do citoesqueleo (fibras proteicas do interior da célula que delimitam sua forma e movimento), que serve de bastidor para os processos de transporte rumo ao interior da célula. A proteína tau aparece sobretudo o prolongamento quase sempre mais largo do neurônio, o axônio, que conduz os sinais elétricos para os demais.
Se a proteína tau modificada não pode cumprir sua função protetora, as consequências previsíveis são catastróficas. Segundo a "hipótese da perda funcional", a estrutura dos neurônios, de vários metros de extensão, não pode ser mantida: desaparecem as comunicações entre eles e a rede neuronal de desfaz. Essa hipótese pode ser testada utilizando-se um dos modelos mais comuns da investigação biomédica, o camundongo. A tese subjacente era de que a completa falta de tau deveria acarretar consequências fatídicas para a rede neuronal do cérebro desse animal.
Em 1994, o grupo de Nobutaka Hirokawa, de Tóquio, gerou camundongos sem tau. Eles estraíram a informação genética da proteína desses animais, para que não pudessem fabricar proteína tau funcional. Mas, para surpresa dos pesquisadores, os camndongos se desenvolveram exatamente da mesma forma que os demais roedores não manipulados, e o sistema nervoso deles não se diferenciava do cérebro dos animais de controle. Assim, os neurônios desses camundongos pareciam não precisar de tau, e a hipótese da perda funcional foi afastada
.

Fonte:

Edição Especial n° 1, maio/2010, da série "Doenças do Cérebro", da revista Mente & Cérebro

sábado, 7 de agosto de 2010

Mentes em Movimento (3)


Saltos e autoestima

[ continuação ]

Ao analisar o tecido cerebral desses ratos treinados em laboratório, Diamond concluiu que o córtex responsável pelas funções cognitivas mais elaboradas, de maneira geral, tinha melhor irrigação sanguínea e era maior, em comparação à mesma região cerebral de animais da mesma espécie criados em gaiolas comuns. Além disso, os animais "estimulados" dessa forma atingem melhores resultados em testes de aprendizagem e comportamento.
Esses experimentos oferecem grandes vantagens aos pesquisadores: um camundongo ou rato
não vive mais de dois ou três anos, sendo assim, é possível estudar o decorrer de sua vida quase
em "câmera rápida". Além disso, as alterações no tecido cerebral podem ser observadas até mesmo em nível molecular com os métodos laboratoriais bem mais refinados desde os usados nos tempos de Diamont. Pela observação, cientístas puderam concluir que há principalmente dois tipos de efeito do exercício sobre o sistema nervoso: estimula o crescimento vascular e o neuronal.
O primeiro refere-se a processos que permitem que as ramificações dos vasos sanguíneos se desenvolvam ainda mais - e não apenas nos músculos, mas também em tecidos neurais. Dos capilares cerebrais provêm os neurônios com oxigêncio e, consequentemente, a energia. Essas
estruturas são fundamentais para o segundo mecanismo: o constante trabalho de construção e reestruturação das próprias células. Um recém-nascido vem ao mundo com a mesma quantidade de neurônios de um adulto: entre 100 e 500 bilhões. No entanto, nos pequenos essas células não estão densamente interligadas. Assim, nos primeiros anos de vida, o plano é "moldar e semear" de acordo com a necessidade e os estímulos, estoques de células não utilizadas rotineiramente são descartados, assim como novas ligações são formadas e fortalecidas. Os neurônios desenvolvem longos prolongamentos, tomam contato uns com os outros por meio das sinapses e criam redes de comuniação que processam informações de forma cada vez mais rotineira.

Da revista Mente & Cérebro n° 211, agosto/2010

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Músculos em forma, cabeça saudável (2)


[ continuação ]

Olhar e lembrar

Nos anos 70, pesquisadores demonstraram pela primeira vez que adultos mais velhos saudáveis poderiam melhorar seu desempenho além do que até então se acreditava. As primeiras pesquisas não estavam totalmente direcionadas a investigar, por exemplo, por quanto tempo os adultos conseguiriam manter as novas habilidades conseguidas com o treinamento, se essas capacidades poderiam influenciar positivamente outras áreas da cognição úteis para a vida diária, e se estudos realizados em pequenos grupos de indivíduos seriam amplamente aplicáveis à maioria das pessoas.
Os últimos experimentos confirmam que treinar a cognição traz benefícios substanciais a adultos maduros e que esses efeitos podem ter duração relativamente longa. Na virada do último século, o Instituto Nacional do Envelhecimento, mantido pelo governo americano, fundou um consórcio de pesquisadores para conduzir um estudo de uma grande amostra de americanos idosos. Em 2002, a psicóloga Karlene Ball, da Universidade do Alabama, em Birmingham, publicou resulados referenes a mais de 2.500 indivíduos
com mais de 65 anos que participaram de 10 sessões de treinamento cognitivo. Os voluntários foram indicados aleatoriamente para um dos três processos: melhorar a memória, o raciocínio ou a busca visual - ou ainda para um grupo de controle que não recebeu treinamento algum. No acompanhamento, dois anos depois, a equipe escolheu, de forma aleatória, parte do grupo inicial para realizar uma atividade de reforço antes da avaliação. Os resultados mostram um forte efeito positivo em cada grupo, comparado aos controles, além de um padrão de melhora do desempenho. Aqueles que treinaram a busca visual, por exemplo, tinham evidências de grandes ganhos nessa área, mas poucas aquisições nos campos da memória e do raciocínio, em relação aos controles. Após cinco anos, testes refeitos com essa mesma amostra indicaram que benefícios mensuráveis ainda estavam presentes depois do longo intervalo. Ainda mais impressionantes, entretanto, são os recentes estudos que focam a função executiva (forma como planejamos a abordagem estratégica para uma tarefa e gerenciamos a atividade processada pela mente.

Da revista Mente & Cérebro n° 211, agosto/2010

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

O enigma ALZHEIMER (3)


Fibrilas de Alzheimer


Pesquisadores do grupo de Paul Thompson, da Universidade da Califórnia em Los Angeles, em colaboração com uma equipe da universidade australiana de Queensland, testemunharam ao vivo esse processo devastador com o uso de técnicas de imageamento cerebral. Por meio de ressonância magnética é possível detectar um foco da enfermidade, que se alastra de maneira incessante pelo encéfalo, como se fosse um incêndio florestal de grandes proporções. A destruição aniquila sucessivamente os centros relativos à recordação, à linguagem e às emoções. São conservadas apenas as regiões encarregadas dos órgãos sensoriais, como visão e tato, e aquelas que controlam os movimentos. A cada ano os enfermos perdem quase 5% da massa encefálica, cifra que se eleva para 10% nas regiões da memória. Adultos sadios perdem apenas 1% a cada ano.
As formações esféricas de proteína beta-amiloide, e as fibras descritas por Alois Alzheimer têm importância fundamental, reconhecem os pesquisadores atuais. Trata-se de dois depósitos muito diferentes no tecido cerebral. As chamadas "placas" são compostas por um pequeno fragemnto proteico denominado A-beta. As fibrilas, ao contrário, são principalmente uma variante modificada da proteina tau e se estendem sobretudo no interior dos neurônios. E não é só isso: elas são abundantes precisamente nas regiões que se degeneram de modo mais claro.

Fonte:
Edição Especial n° 1, maio/2010, da série "Doenças do Cérebro", da Revista Mente @ Cérebro

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Mentes em Movimento (2)


[ continuação ]

Saltos e autoestima

De maneira geral, a sociedade ocidental não atribui grande valor ao exercício para o desenvolvimento infantil. Adultos costumam fazer as crianças desde pequenas ficar sentadas e quietas em vez de correr por aí, a se concentrar, no lugar de pular de um lado para outro. A televisão, o computador e os videogames também colaboram para tirar dos pequenos a vontade natural de se movimentar.
Com isso, aparecem prejuízos primeiramente para o estado geral de saúde, com o surgimento de problemas posturais e obesidade, por exemplo. O corpo e o psiquismo podem não amadurecerem independentemente - como uma função motora desenvolvida de forma insuficiente, por exemplo, pode frear o intelecto, pois, quanto mais segura a criança está ao explorar seu ambiente, mais facilmente absorve novos estímulos. Dessa forma, subir nas coisas, saltar e correr marca o início de um ciclo que reforça a si mesmo.
Um estudo coordenado pelo pesquisador Charles Hillman, da Universidade de Illinois, em Urgana-Champaign, e publicado em 2008 mostra que crianças que se movimentam mais, em geral, obtêm melhores notas na escola. O desempenho em cálculo ou leitura, por exemplo, aumenta proporcionalmente à atividade física. No entanto, podemos perguntr aqui, com razão, o que determina esse resultado: será que pais que apoiam mais seus filhos em questões escolares também os estimulam mais a praticar esportes? A correlação entre valores estatísticos, porém, não revela nada sobre motivos mais profundos.
O pesquisador Phillip Tomporowski, da Universidade da Geórgia, também confirmou que o bom condiconamento físico de crianças é acompanhado de melhores resultados escolares. No entanto, ainda não é possível demonstrar experimentalmente a influência do esporte sobre o desempenho cognitivo. O que se sabe é que nem toda prática esportiva estimula a capacidade intelectual. O condicionamento aeróbico por meio de atividade muscular moderada costuma ser considerado frutífero, assim como treinamentos de força parecem reforçar a capacidade de planejar e coordenar ações - em resumo, aquilo que chamamos "capacidades executivas".
Outro grande grupo de estudos, no qual em geral são utilizados camundongos e ratos, defende que a atividade física prepara a mente para o aprendizado. Experimentos para testar o efeito de treinamentos físicos sobre o cérebro de roedores remontam aos anos 60. A neurobióloga Marian Diamond, da Universidade da Califórnia em Berkeley, hoje com 78 anos, foi considerada pioneira nessa área. Ela criou animais em "ambientes enriquecidos", gaiolas cheias de "brinquedos", onde as cobaias eram constantemente estimuladas de forma lúdica. Entre os roedores, as rodas de exercícios são as preferidas, eles percorrem, sem dificuldade, cinco a seis quilômetros por dia.

Da revista Mente & Cérebro n° 211, agosto/2010