Modo de avaliação de currículo de pesquisadores brasileiros incentiva produção de muitos artigos modestos em vez de poucos com maior qualidade
Gonçalo Viana |
Por essa razão, tornou-se praxe pontuar currículos apenas com base no número de publicações, configurando a infame “numerologia” que ainda domina o sistema de avaliação brasileiro. Esse modo de avaliação incentiva os pesquisadores a publicarem muitos artigos modestos em vez de poucos com maior qualidade e complexidade. O problema fica evidente quando contrastamos o avanço recente na quantidade de artigos brasileiros com a estagnação do impacto internacional dessas publicações. Cada vez mais numerosos, os artigos brasileiros continuam em sua maioria pouco citados, invisíveis internacionalmente.
Isso fica claro quando se calcula o índice H, proposto para estimar o impacto da produção de um cientista com base no número de vezes que seus trabalhos foram citados. O índice H de uma pessoa ou grupo é definido como o número de artigos publicados com citações maiores ou iguais a esse número. Para dar um exemplo, se alguém tem índice H igual a 10, significa que tem 10 trabalhos publicados com pelo menos 10 citações cada. O índice H traz embutida a avaliação criteriosa não de um único leitor, mas de toda a massa da comunidade de especialistas na área. Quando se calcula o índice H dos cientistas brasileiros, verifica-se que a maioria não chega a 10 mesmo ao final da carreira.
É, portanto, curioso que jovens cientistas brasileiros tenham sido criticados por terem “índice H de adolescente”. Por sua própria natureza, o índice H começa em zero e tende a aumentar com o tempo. Isso significa que todos os cientistas que têm H alto passaram em algum momento pelo nível intermediário. Ter “índice H de adolescente” é algo que só acontece a quem conseguiu escapar da produção invisível, inseriu-se internacionalmente e ruma para a maturidade acadêmica.
Um bom exemplo ocorre com Richardson Leão, Katarina Leão e Adriano Tort, docentes do Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). São neurocientistas com menos de 40 anos que vêm produzindo artigos focados na qualidade e não na quantidade. Têm índice H entre 5 e 15. Em outubro de 2012 publicaram na revista Nature Neuroscience um importante estudo optogenético sobre o processamento de memórias no hipocampo, em colaboração com cientistas da Universidade de Uppsala, na Suécia. O mesmo artigo poderia ter sido desmembrado em vários pequenos textos, gerando um número maior de publicações à custa da diminuição de seu impacto. Meus colegas optaram por concentrar seus esforços, publicando num único manuscrito várias descobertas, mirando nos critérios de avaliação internacional mais rigorosos. Criticá-los por ainda não terem um maior índice H é esquecer que o futuro pertence aos jovens.
Do site: www.mentecerebro.com.br
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