“Fins éticos exigem meios éticos."
(Marilena Chauí)
A
geração Y possivelmente nunca ouviu falar de Gérson de Oliveira Nunes,
jogador de futebol que integrou a equipe campeã mundial em 1970. Seu
nome ficou eternizado quando, em 1976, protagonizou uma propaganda de
cigarros na qual, após desfilar os diferenciais do produto, proclamava:
“Gosto de levar vantagem em tudo, certo? Leve vantagem você também”.
Assim nasceu a “lei de Gérson”, amplamente estudada por sociólogos e
antropólogos, utilizada para designar a natureza utilitarista do
brasileiro.
A
estabilidade econômica advinda com o sucesso do Plano Real (1994),
associada às políticas de transferência de renda da última década,
conduziram-nos ao mercado de consumo. Experimentamos com uma defasagem
de 50 anos o que norte-americanos vivenciaram em meados do século
passado. O controle da inflação e a expansão do crédito fizeram-nos
descobrir o prazer de comprar. E isso modificou nossos padrões éticos.
Em
ano de eleições esta constatação é cristalina. Não importam os
escândalos e desmandos de governos, em todos os seus níveis, revelados
pela imprensa. Pouco importa a biografia dos candidatos. Torna-se
insignificante a história dos partidos e os conchavos entre as legendas.
A sociedade está anestesiada, porque foi entorpecida pela ética do
resultado.
Nas
escolas privadas, estudantes deixaram de ser aprendizes para se
tornarem clientes. Assim, pagam uma mensalidade como quem compra um
diploma em suaves prestações, exigindo não a qualidade de ensino, mas
sim as facilidades para serem aprovados. Vale a pretensa inclusão no
mercado de trabalho.
Nas
empresas, fala-se em sustentabilidade e responsabilidade social, mas o
caixa-dois e a sonegação fiscal são ostentados como imperativos para a
competitividade. Vale a manutenção do lucro na voraz economia de
mercado.
Os
cidadãos criticam e queixam-se dos abusos praticados pelos políticos e
pelo serviço público, mas não hesitam em trafegar pelo acostamento,
pedir desconto ao dentista para realizar um tratamento sem emissão de
recibo ou mesmo obter uma carteirinha de estudante forjada para garantir
desconto em eventos culturais. Vale a garantia de um benefício pessoal.
Dentro deste contexto, ressurge
o princípio maquiavélico de que os fins justificam os meios. Isso
explica nossos comportamentos e nossas escolhas. Mas também denota
nossos valores e nossa omissão – ou conivência.
Todo
processo eleitoral é emblemático para aflorar discussões desta estirpe,
porque independentemente da retórica dos candidatos, do tempo de
exposição na mídia ou dos recursos financeiros envolvidos em uma
campanha, a decisão final é do cidadão que, solitária e sigilosamente,
sentencia seu futuro e o da nação diante da urna.
Muito
valor é dado às eleições majoritárias, ou seja, aquelas que elegem
presidente, governadores, prefeitos e senadores. Mas é importante
alertar para a relevância extrema das eleições proporcionais, isto é, a
que seleciona deputados e vereadores, pois são estes os que mais
próximos estarão do eleitor.
A
“lei de Gérson” não sucumbiu, mas apenas ganhou nova roupagem.
Precisamos resgatar a ética da intenção em contraposição a esta ética do
resultado. Urgentemente.
* Tom Coelho
é educador, conferencista e escritor com artigos publicados em 17
países. É autor de “Somos Maus Amantes – Reflexões sobre carreira,
liderança e comportamento” (Flor de Liz, 2011), “Sete Vidas – Lições
para construir seu equilíbrio pessoal e profissional” (Saraiva, 2008) e
coautor de outras cinco obras. Contatos através do e-mail tomcoelho@tomcoelho.com.br. Visite: www.tomcoelho.com.
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