quinta-feira, 20 de outubro de 2011

A cura pela palavra (1/7)

Da revista Mente & Cérebro, Edição 225 - Outubro 2011

O psicanalista Christian Dunker, colaborador de Mente e Cérebro, fala sobre seu novo livro, Estrutura e constituição da clínica psicanalítica, em entrevista à editora Karnac Books, que lançou a obra na Inglaterra



1. O que levou o senhor a escrever este livro?

No Brasil, os cursos de psicologia nas universidades incluem experiência prática e a necessidade de lidar com pacientes em contextos inspirados pela clínica psicanalítica. Como professor do instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP), eu tenho de lidar com estudantes que são obrigados a atender pacientes pela primeira vez. Frequentemente, como bons alunos, eles procuram saber sobre a história da prática que vão começar. A única resposta que tinha para dar dizia respeito à história da própria psicanálise, não à história das habilidades específicas que você deve ter para enfrentar as questões de tratamento, cura e terapia como uma experiência clínica. Dessa forma, o livro resulta de uma "demanda prática", a que eu pretendi responder de forma organizada e crítica, não simplesmente em termos de um repertório de saberes ou disposições de ação, mas como práticas inseridas em uma lógica histórica, mesmo que não linear.


2. Resumidamente, de que fala o livro?

Situo a psicanálise como uma prática por meio de uma espécie de arqueologia de contextos e experiências sociais que dão origem ao tratamento psicanalítico, desde a função terapêutica das narrativas e epopeias, no universo greco-romano e judaico-cristão, até o século 21. Em cada capítulo, examino uma "prática" analisada como um "processo histórico", às voltas com sua inscrição em contradições sociais cujas características representam uma problemática específica, tais como: xamanismo, mitologia, retórica e terapias de compromisso narrativo, a medicina da alma (Platão, Empédocles, Hipócrates), a encenação das tragédias gregas, o cuidado de si helênico e a arte da escrita como uma cura da alma (no trabalho, por exemplo, de Montaigne). Mesmo em nossa modernidade, autores como Descartes, Kant e Hegel são examinados em relação à prática que inspiram (método, a meditação, a regulamentação da alma, a experiência da loucura, hipnotismo e auto-historicização). A importância de trabalhar com essas referências é que elas permitem tornar visível como fazemos coisas diferentes quando praticamos a psicanálise, o que ajuda a explicar sua diversidade bem como parte de suas tensões éticas, políticas, epistêmicas e metodológicas.

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