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Pessoas de diferentes cantos do mundo têm assistido, abaladas, às imagens dos efeitos de catástrofes e desastres ocorridos nos últimos anos. Nestes novos tempos de aceleração dos processos de comunicação entre os povos, o mundo globalizado parece menor. O crescimento desordenado da população em várias regiões do planeta tem colaborado de forma decisiva para a ocorrência de tragédias – e para tanto sofrimento. Não à toa, as cenas apresentadas chegam a provocar no público a sensação de estar diante de um espetáculo surrealista. O nível de devastação é tão intenso que se torna quase impossível de ser reconhecido como parte da realidade.
Não só enchentes e desabamentos – como os que ocorrem no Brasil durante os períodos de chuva – mas também tsunamis, terremotos e furacões sensibilizam a população e trazem uma grande questão aos profissionais de saúde. “Os desastres naturais e/ou sociais, provocados ou não pelo ser humano, são desafios que exigem repensar não só o modo como o ambiente irrompe no psiquismo como também as reações pessoais e os impactos psicológicos”, afirma o psiquiatra e psicanalista Moty Benyakar, presidente da Secção de Intervenção em Desastres da Associação Mundial de Psiquiatria (WPA, na sigla em inglês). Segundo o pesquisador radicado na Argentina, “muitas vezes, nesses casos, ocorrem situações que nos obrigam a rever alguns princípios da ética e da metodologia terapêutica”.
É possível pensar, portanto, que novos paradigmas para a saúde e, especialmente, para a saúde mental, precisam ser considerados quando fenômenos desequilibram de forma trágica e imprevisível a estabilidade emocional, o ambiente e os vínculos afetivos. Indivíduos e comunidades que vivem de forma organizada são assolados por uma inesperada violência geradora de estresse com proporções assustadoras. Basta imaginarmos, mesmo de forma generalizada, um cidadão comum que sofre o impacto de um evento devastador que o leva, em algumas horas, a perder seus entes queridos, sua casa e seus pertences. Seu universo material, físico e emocional sofre um abalo irreversível, pois seu ambiente, sua história e os vínculos construídos ao longo do tempo desaparecem instantânea e inesperadamente.
Para compreender as consequências psíquicas deste processo, voltemos ao conceito de trauma desenvolvido por Sigmund Freud. A palavra refere-se à ideia de ferida ou furo e está associada a um fluxo excessivo de energia mental que acaba por incapacitar o indivíduo de processá-la. A intensidade da experiência, portanto, impede a elaboração de seus conteúdos, provocando vários sintomas. O colapso pode romper as articulações entre os afetos e por esta razão tudo parece perder o sentido em situações traumáticas. Nesse momento nos defrontamos com o indizível e irrepresentável – algo com que a mente não dispõe de recursos para lidar. Em psicanálise, pode-se dizer que esta experiência tão singular remete a sensações primitivas, ligadas ao desamparo angustiante dos primeiros meses após o nascimento. |
Erane Paladino e José Toufic Thomé Erane Paladino, mestre em psicologia clínica, é coordenadora e professora do Departamento de Psicodinâmica do Instituto Sedes Sapientiae. José Toufic Thomé, coordenador da Comissão Técnica sobre Intervenções em Desastres e Catástrofes do Departamento de Psicoterapia da Associação Brasileira de Psiquiatria, representante brasileiro no Comitê Executivo da Sessão sobre Intervenções em Desastres e Catástrofes da WPA, delegado na Organização das Nações Unidas (ONU) e coordenador do Centro Brasileiro de Estudo, Pesquisa e Intervenção em Desastres e Catástrofes do Departamento de Psicodinâmica do Instituto Sedes Sapientiae. |
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